terça-feira, 11 de maio de 2010

Lendas Urbanas (Rita Elisa)

Guapuruvu

Quando eu fiz a pesquisa sobre as Árvores Imunes de Corte em São José dos Campos, houve uma pela qual fiquei fascinada: guapuruvu, também conhecida como faveira ou pau-de-vintém. Foi catalogada pelo paisagista Roberto Burle Marx, que apaixonado pela exuberância dessa espécie arbórea nativa da região do Vale do Paraíba, deu a ela o nome científico de Schizolobium parahyba, passando a ser conhecida em todo planeta como a árvore do Vale do Paraíba. Por isso o paisagista fez a inclusão de alguns exemplares de guapuruvu ao paisagismo do complexo formado pela antiga Tecelagem Parahyba e Fazenda Santana do Rio Abaixo, bem em frente à Residência Olivo Gomes. È fascinante o porte dessa árvore, podendo atingir até mesmo uns 30 metros de altura.
Existe na Região Leste de São José dos Campos, exa-tamente dentro do terreno onde está edificado a Escola Municipal de Ensino Fundamental Leonor Nunes Galvão, na praça José Molina, perto da igreja São Sebastião, um lindo e raro exemplar da árvore guapuruvu. Lindo porque na primavera suas flores trans-bordam da copa e um tapete amarelo cobre pedaço do passeio e da rua. Raro porque deve ser o guapuruvu mais antigo em área urbana joseense, deve ter mais de 100 anos, sua copa é tão alta que em vários locais da Vila Industrial podemos avistar a árvore. Conversando com os antigos moradores da vila e professoras da EMEF Leonor N. Galvão, todos foram unâni-mes em dizer que é a árvore mais bonita da região. Aproveitei para resgatar duas lendas a respeito dessa árvore.
A primeira é que antigamente as crianças brincavam de comércio usando as sementes do guapuruvu como moeda de troca (significado de pau-de-vintém), pelo tanto que davam valor às sementes, originando uma expressão que virou lenda: uma pessoa ao ser presenteada com uma semente de Garapuvu, para sempre é selada essa amizade.
A outra lenda vem de muitos anos... na oralidade dos índios Tupis que viviam na região do Vale do Paraíba e pelos Tupinambás do Litoral Norte, em registro de Mariza Taguada. Quando ainda não havia tanta tribo nessa terra, há muitos e muitos anos, por aqui vivia um jovem e forte guerreiro chamado Guapuruvu. Certa noite não conseguindo dormir, por causa de uma misteriosa inquietação, saiu da rede e caminhou pela floresta mal iluminada por causa da lua nova. Dentro da mata distinguiu um vulto dourado movendo-se por entre as folhagens. O corajoso e inconsequente guerreiro embrenhou-se na mata atrás daquele brilho, quieto e rasteiro, como uma grande onça. Guapuruvu, fascinado pela luz dourada chegou à nascente de um rio e assustou-se ao ver uma linda mulher de corpo dourado e longos cabelos negros banhando-se nas singelas águas. O mais espetacular era que as gotas d’águas que a tocavam transformavam-se em pepita de ouro e rolavam para dentro do rio. O guerreiro sentiu o coração bater forte e temendo que a formosa moça percebesse sua presença escondeu-se, permanecendo no mesmo lugar, hipnotizado, a noite toda, até o dia amanhecer e voltar para a aldeia. Os dias se passaram e todos da tribo notaram o olhar desvairado que Guapuruvu lançava à mata e a agitação que tomava conta dele enquanto esperava pela lua nova... ansioso para encontrar sua amada. Assim, na primeira noite da lua nova ficou à espreita e não viu a linda mulher. Retornando à aldeia nem conseguiu caçar ou pescar. Os outros perguntavam o que ele tinha, mas ele nada dizia. Na noite seguinte retornou à trilha do rio. A escuridão era tanta que Guapuruvu tropeçou e machu-cou-se nos cipós, galhos e raízes até chegar à nascente do rio. Foi quando viu uma luz chegando e transfor-mando-se na linda jovem. Inebriado, soltou um suspiro alto, atraindo a atenção da jovem que, assustada, fugiu deixando para trás um rastro de poeira púrpura.
Guapuruvu passou horas e horas chorando à beira da nascente e pedindo para que ela voltasse. A linda moça, depois de passar o susto, atraída por aqueles lamentos tristes e aquelas juras de amor que o rapaz não cansava de repetir, apareceu para o jovem guerreiro que, de tanta felicidade, lançou-se aos pés da amada jurando amor eterno. Ela se apresentou como a Mãe do Ouro, disse que era a guardiã das florestas e protetora dos animais. Ia sempre até o rio banhar-se pois sua missão era a de criar pepitas de ouro. Explicou ao jovem Guapuruvu que ela não podia casar-se com ele, nem dar-lhe filhos como as moças da tribo, mas corresponderia ao seu amor. Dessa forma nas noites de lua nova o jovem Guapuruvu saía da aldeia para encontrar e amar a Mãe do Ouro.
Os anos se passaram e o índio guerreiro envelheceu enquanto que a Mãe do Ouro continuava jovem e bonita. Mas o amor dos dois não foi afetado por isso. Certa noite ele pressentiu que aquela seria sua última lua em vida. Já muito velho, com extrema dificuldade, chegou à nascente do rio onde a Mãe do Ouro já o aguardava. Ele, muito comovido em deixá-la, despediu-se suspirando amores eternos. Abraçaram-se enternecidamente e, quando Guapuruvu fechou os olhos, transformou-se em uma grande e frondosa árvore de madeira forte, ereta, ao pé da nascente, pois dessa forma para sempre veria sua amada. A Mãe do Ouro profetizou que o amor deles seria eternizado nas raízes, no tronco e nos fortes galhos da árvore Guapuruvu, que a árvore serviria aos índios quando transformada em canoa de um pau só. Por isso, quando em noite de lua nova, vemos um rastro de ouro passeando pela mata é a Mãe do Ouro que vai namorar o Guapuruvu.
Quem sabe, lá pelas altas horas da madrugada, numa noite de lua nova, ao passarmos pela praça José Molina na Vila Industrial possamos ver um rastro de luz abraçando o maravilhoso Guapuruvu.

Rita Elisa Seda

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